Sala de aula online


Sem TítuloEm mestrados, licenciaturas ou formações livres, a oferta de cursos à distância desenvolve-se na região, no país e no mundo. O conceito não é novo, mas as tecnologias da informação vieram dar-lhe um novo impulso e novos contornos.

Terminou o 12.º ano do ensino profissional com a vontade de continuar a estudar, mas teve de dar prioridade ao trabalho. Aos 29 anos, Ana Catarina Santos conseguiu concretizar os planos, conciliando o trabalho com a frequência do curso de Educação Básica à distância. “Tenho um horário de trabalho, das 9:30 às 19:30 com duas horas de almoço, folga rotativa, e com tudo isto tenho de gerir tempo para os estudos”, explica.

Ser aluno hoje em dia já não implica obrigatoriamente a presença numa sala de aulas, com quadro branco, mesas e cadeiras. Cada vez mais, são ministrados cursos online, lecionados por professores que disponibilizam conteúdos e aulas através de uma plataforma de ensino. Uma das mais comuns em Portugal é o Moodle, mas há outras como, por exemplo, o Blackboard.

Rita Cadima, Diretora da Unidade de Ensino à Distância do IPLeiria, explica que existem muitas definições e modelos para o denominado ensino à distância: “antigamente, este termo estaria relacionado com a telescola e com a troca de correspondência enquanto na atualidade, este regime está muito mais ligado às novas tecnologias, a novas metodologias de aprendizagem e a atividades de aprendizagem online que exigem um papel ativo por parte do estudante e a colaboração entre estudantes”.

As metodologias podem ser utilizadas como meio de formação total ou como complemento ao ensino presencial. No Instituto Politécnico de Leiria, por exemplo, o modelo adotado é em muitos cursos um modelo que concilia componentes de trabalho em plataforma com sessões presenciais. A docente acrescenta que nos dias de hoje não haverá um ensino superior somente presencial, pois, mesmo nos cursos presenciais, existe uma ligação cada vez mais estreita entre a aprendizagem em sala e a aprendizagem online.

Carla Freire, professora desta modalidade de ensino no mestrado em Comunicação Acessível do Instituto Politécnico de Leiria, acredita que esta é uma metodologia de ensino à qual cada vez mais alunos aderirão e que desempenhará um papel de relevância no futuro do ensino português, assumindo-se como uma alternativa ao ensino presencial. Acrescenta ainda que é bastante vantajosa para trabalhadores estudantes, pessoas com mobilidade reduzida ou que residam longe da instituição de ensino, permitindo também uma aprendizagem mais autónoma e uma melhor gestão do tempo, por parte de alunos e docentes.

Autonomia e disciplina

Autonomia e disciplina são as palavras mais ouvidas quando se questionam alunos e docentes sobre as suas experiências neste tipo de curso. Embora reconhecendo as potencialidades de conciliar formação e emprego, Ana Catarina Santos, sublinha que “o ensino a distância requer muita disciplina e método de estudo e trabalho. São exigidos por cada unidade curricular trabalhos de pesquisa com datas e tempo de entrega”. Ana refere que “conseguir fazer todas as disciplinas sem deixar nada de um ano para o outro “exige muitíssimo” do aluno: “Agendo prazos de entrega, dou prioridade às datas mais recentes para poder ser entregue na data prevista”, conclui.

Ana Catarina Santos refere também uma gestão mais individualizada do estudo e uma diferente gestão dos tempos. Estuda sozinha, nos horários em que lhe é possível e quando tem uma dúvida, coloca ao professor no fórum, sabendo que terá de aguardar pela resposta, que, por vezes, não é imediata.

Também Paulo Cruz, aluno de ensino a distância em Relações Humanas e Comunicação Organizacional, refere a exigência, “pois obriga os alunos a terem de realizar muito trabalho autónomo, o que os prepara para possíveis empregos no futuro, mas que os faz também sentir-se isolados.” Paulo refere a necessidade de “contrariar a ideia de que o regime de ensino a distância é menos rigoroso e mais simples que o ensino presencial, porque é precisamente o oposto”. Para este estudante, o sistema de ensino a distância é “bastante exigente e trabalhoso, pois obriga os alunos a desempenhar diversas tarefas de forma autónoma e contínua”, afirmando mesmo que as exigências e dificuldades deste modo de ensino são “iguais ou superiores às do ensino presencial”.

Paula Ruivo, aluna de ensino a distância no curso de Relações Humanas e Comunicação Organizacional, resume a experiência como “disciplinadora, abrangente, desafiadora e gratificante”. E explica: “disciplinadora por ter de conseguir gerir, autonomamente, trabalhos e tarefas para as diferentes unidades curriculares. Abrangente por ter aprendido a utilizar diferentes ferramentas informáticas (como por exemplo Excel, Skype, Adobe)”, desafiadora no sentido em que teve de “conciliar a vida pessoal, a família e o trabalho, com a sua formação na licenciatura”. A aluna refere que aprendeu a ser “mais cuidadosa a pesquisar e a selecionar informação online”, passando a sentir-se “mais confortável” no uso de tecnologias e ferramentas informáticas. “Com o ensino a distância o meu computador transformou-se numa via poderosa de acesso ao mundo digital”, conclui.

Para além da plataforma de trabalho, estudantes e docentes podem ainda recorrer ao apoio de outras tecnologias da comunicação para esclarecimento de dúvidas, apoio no desenvolvimento
de trabalhos individuais ou em grupo.

Mafalda Casimiro, coordenadora do curso de Relações Humanas e Comunicação Organizacional da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (ESECS) do IPLeiria, explica que os alunos do regime de ensino a distância têm de ser bastante disciplinados para responderem às solicitações de cada disciplina, uma vez que o nível de exigência do ensino a distância não é inferior ao do ensino presencial. A docente refere que o sistema de aprendizagem à distância pode ser mais árduo do que o presencial, precisamente por os alunos terem de organizar as suas vidas de modo a realizarem, com sucesso, as tarefas disciplinares que lhes competem. Na perspetiva de Mafalda Casimiro, pessoas que não ingressaram logo no ensino superior e pessoas que queiram tirar outras licenciaturas para além das que já possam ter serão o nicho que irá enveredar no regime de ensino à distância.

Flexibilidade

Como vantagens da modalidade, Rita Cadima enumera a qualidade da aprendizagem, a metodologia adotada e as tarefas mais adaptadas às especificidades dos alunos, pois é possível ajustar as tarefas aos seus perfis de aprendizagem.

Para Lúcia Magueta, coordenadora do curso de Educação Básica a Distância do IPLeiria, o ensino à distância não substitui o papel do professor, e que também para o professor é uma metodologia que requer muita preparação e tempo para acompanhamento. Este continua presente para os alunos, disponibilizando conteúdos e materiais e orientando as tarefas em cada uma das unidades curriculares. Na ótica da docente, as principais características desta tipologia de ensino são a flexibilidade de espaço e de tempo, e o facto de a plataforma ser uma ferramenta fácil de usar, em que os alunos não precisam de muitos conhecimentos informáticos para trabalhar. A professora explica ainda que a preferência das pessoas entre ensino presencial e ensino à distância é algo que “depende da fase da vida de cada pessoa”. Os estudantes do curso de Educação Básica a distância, por exemplo, são pessoas com idades compreendidas entre os 35 e os 40 anos, com filhos, trabalhadores, e residentes em diferentes zonas do país.

Segundo Rita Cadima, a maioria das pessoas a recorrer ao sistema de ensino a distância são trabalhadores, com uma maior maturidade e autonomia. A responsável indica que no IPL o número de alunos em licenciaturas e mestrados tem vindo a aumentar, sendo também massiva a adesão a formações abertas de curta duração.

Online como apoio à internacionalização

No final de 2014, a questão do ensino à distância foi uma das prioridades assumidas pelo Governo português. No relatório “Uma estratégia para a internacionalização do ensino superior português”, assinado por um grupo de trabalho coordenado pelo ex-reitor da Universidade do Algarve João Guerreiro, a realização de cursos online e o ensino à distância são considerados prioritários para captar alunos estrangeiros. Mais de 31.000 estudantes internacionais frequentavam o ensino superior em Portugal no ano letivo 2013/2014, sendo que 85 por cento eram oriundos de países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) ou da União Europeia.

A estratégia aponta para a ampliação da oferta de cursos na modalidade de ensino à distância, cobrindo uma oferta diversificada de graus e cursos de curta duração. O grupo de trabalho considera que há uma “ampla margem de progresso para a atração de mais estudantes internacionais”, sendo o objetivo duplicar o efetivo até 2020.

 

Texto: Guilherme Francisco | Carolina Batista