Numa carta que escreveu ao seu irmão mais novo, Theo, no verão de 1882, Vincent Van Gogh, expressava a sua mais profunda intenção como artista: “Eu quero pintar quadros que movam as pessoas. Quero chegar ao ponto que as pessoas digam do meu trabalho: ‘este homem sente profundamente e ele sente subtilmente’.” Hoje, Van Gogh é um dos pintores mais famosos e importantes da História, com o seu estilo inovador pós-impressionista, caraterizado pelas cores fortes e pinceladas dramáticas, impulsivas e enérgicas, sendo “A Noite Estrelada”, o ex-líbris da sua manifestação artística.
A sua notoriedade não é só devida ao seu trabalho, mas também à vida trágica e tortuosa, denotada pela incompreensão perante a sua arte, expressa por todos os que o rodeavam. A solidão e a infelicidade corromperam a sua saúde mental, levando ao afamado ato de cortar a sua própria orelha, e culminando no suposto suicídio com um tiro no tronco.
Loving Vincent explora tanto a sua morte como a sua vida, recontada pela perspetiva das pessoas que cruzaram o seu caminho. A história segue Armand Roulin, na sua missão de entregar uma carta a Theo Van Gogh, e no processo desvendar as circunstâncias dúbias da morte de Vincent em Auvers-sur-Oise, perto de Paris. Armand ouve os testemunhos dos seus habitantes, que constroem retratos polarizados à volta da personalidade controversa e volátil do defunto.
Loving Vicent é o primeiro filme totalmente pintado, ou seja, cada frame é um quadro por si só. No total, foram pintados 65 mil quadros a óleo por mais de 100 artistas durante 2 anos, nos estúdios em Gdansk e Breslávia, na Polónia, e num estúdio em Atenas. Alguns dos seus protagonistas são as próprias obras do ilustre pintor, que são transpostas da tela para o ecrã, e reconfiguradas para corresponder com a meteorologia e altura do dia descritas no argumento.
Podemos considerar este trabalho como a mais completa homenagem alguma vez feita. A vida e obra em perfeita comunhão, seguindo as próprias palavras do artista: “só podemos falar através das nossas pinturas”. Uma verdadeira carta de amor ao homem que viveu em constante perturbação e dúvida, e que se descrevia aos olhos dos outros como “um ninguém, uma não-entidade, uma pessoa desagradável”, e que um dia, gostaria que o seu trabalho mostrasse “o que esta não-entidade tem no seu coração.”
“With a handshake, loving Vincent.”
Texto: André Ferreira