
Muitas vezes subestimado, o associativismo estudantil é uma experiência importante da vida escolar e académica. Estudantes que, longe dos holofotes de eventos académicos, trabalham para dar voz aos anseios dos colegas e para organizar projetos e iniciativas agregadores da comunidade.
A “desvalorização social e o preconceito” são, para João Baldaia, coordenador da Cultura Académica da Associação Académica de Coimbra (AAC), o maior obstáculo ao trabalho desenvolvido pelas Associações de Estudantes. Um sentimento partilhado por Luana Ungureanu, atual presidente da Associação de Estudantes da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (AE ESECS) do Politécnico de Leiria. Para a estudante, o associativismo jovem “pouco ou nada é valorizado”. Luana acrescenta que, ainda que haja estudantes que valorizam o seu trabalho, “há uma maior parte que vê as associações com alguma indiferença”, resultante da falta de informação sobre o associativismo como um todo.
Maria Coutinho começou como vice-presidente da AE da ESECS, assumiu o papel de secretária da Comissão de Finalistas e é agora presidente da Mesa da Assembleia Geral da AE ESECS e afirma que há uma luta a ser travada “contra o conformismo e a apatia que se instalou em alguns setores do meio académico”, pelo que a tentativa de ganhar o respeito é uma batalha constante das associações. Como desafios que as associações enfrentam, Maria Coutinho refere as burocracias, a pressão académica e a escassez de recursos.
Não serem levados a sério é um dos maiores obstáculos para Carolina Coelho, vice-presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo: “Mandarmos mensagem e emails e não termos respostas”. A estudante refere a pressão do julgamento e admite que o facto de estar exposta a leva a lidar com alguns tipos de críticas e que “uma pessoa pensa que se está a fazer por bem ninguém vai criticar, mas afinal não é bem assim”.

Representar os interesses dos alunos
Com mais ou menos tempo de experiência, estes estudantes têm algo em comum: participam ativamente em associações de estudantes. Margarida Oliveira, presidente da AE da Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo, já tinha sido vogal numa lista, mas sempre teve vontade de fazer parte de uma AE de forma mais ativa e “fazer mais do que aquilo que as associações de estudantes normalmente fazem”. Considera-se ambiciosa, pelo que decidiu constituir uma lista com uma amiga e acredita que está a deixar uma marca, pelo empenho e projetos realizados. Defende que uma Associação de Estudantes pode fazer a diferença: “Quando os alunos veem que há projetos a acontecer, que há vontade de melhorar o dia a dia da Escola, acabam por se sentir mais conectados com a comunidade escolar e a escola passa a ser mais do que as aulas e as notas”.
Apesar de reconhecer ser uma jornada de altos e baixos, também Lara Miguel, vice-presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, refere que “representar os colegas e fazer por eles é um desafio”, mas acredita que “a sensação de realização no final compensa todo o esforço”.
A presença em decisões que preocupam os estudantes, procurando beneficiar o seu bem-estar na instituição académica, faz com que Maria Coutinho afirme que as Associações de Estudantes “têm um impacto real e concreto, mesmo que nem sempre seja visível para todos”. Estas associações procuram que a vivência estudantil seja positiva e marcante através da discussão aberta: “Conseguimos representar os estudantes ao participar ativamente em vários órgãos de decisão”. “É muito importante que haja estudantes a representarem outros, para existirem melhorias e para que se possam posicionar de alguma forma”, explica também Luana Ungureanu, da mesma Escola.

A mudança a vários níveis e escalas realizada pelas associações foi verificada em diversos períodos históricos, tal como em 1974, quando a Associação Académica de Coimbra contribuiu para a afirmação do processo revolucionário e do posicionamento de um movimento jovem. “Para uma estudante como eu, ter uma AE que me mostra que isso é possível, que as minhas ideias podem ser ouvidas, que eu posso contribuir para uma escola, para uma sociedade melhor, para mim já tem um impacto”, partilha Carolina Coelho. Margarida Oliveira reforça: “Uma Associação de Estudantes com iniciativa pode realmente marcar a diferença”. Refere, para isso, a importância da vontade, do empenho e da equipa no cumprimento da visão de uma escola melhor.
A motivação passa por esta vontade de construir, mas, como explica Margarida Oliveira, é importante “saber conciliar o trabalho da AE com os estudos e com a vida pessoal”. Carolina Coelho descreve esta caminhada como “importante, interessante e um bocadinho frustrante” e explica que só agora tomou a decisão pela menor carga horária que tem no 12.º ano. Foi também no ano de finalista que Luana Ungureanu se envolveu neste projeto, em que indica procurar “representar os interesses dos alunos e promover iniciativas que impactem a vida académica e o dia a dia dos estudantes”. Para Luana, conciliar o trabalho da associação com a vida académica e pessoal “exige uma boa organização”.
Competências transversais únicas
Transformando os desafios em oportunidades, diversos estudantes consideram a participação neste tipo de associativismo uma possibilidade de desenvolvimento pessoal e profissional. Para Luana Ungureanu, a experiência obtida numa Associação de Estudantes constitui um benefício na melhoria de competências importantes para o mercado de trabalho, além de oferecer oportunidades únicas, como trabalhar com vários associados de todo o país, com diferentes experiências. “Lidar com a exposição à frente de alunos e pessoas a quem tivemos de pedir patrocínios”, além da gestão monetária, são fatores que Carolina Coelho também destaca: “Uma rapariga de 17 anos, num intervalo, recebe o pagamento do baile de finalistas de cinco pessoas, uma quantidade de dinheiro enorme. Recebemos dinheiro que não é nosso, e que fica ao nosso encargo”.
A presidente da AE da Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo, Margarida Oliveira, sublinha aprendizagens como o trabalho em equipa, a necessidade de lidar com opiniões diferentes, a rápida resolução de problemas e a gestão de tempo, “coisas que não se aprendem só nas aulas”.
Também Rodrigo Monteiro, presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, considera que a experiência no associativismo permite desenvolver capacidades de liderança, comunicação, responsabilidade e gestão de projetos, um conjunto de competências que, para Rodrigo, são “úteis em qualquer carreira”. E não são referidas apenas competências técnicas. João Baldaia afirma que, com o envolvimento na Associação de Estudantes, sentiu um aumento na sua autoconfiança, a partir do momento em que as pessoas começaram a vê-lo como responsável: “Posso confiar nele para tratar dos meus problemas”.

Cidadãos mais ativos e conscientes
Para João Baldaia, “o associativismo é uma verdadeira sala de aula” e acredita que, no futuro, a digitalização e a aposta em causas ambientais serão fundamentais para a sua evolução. Esta é uma visão partilhada. “O associativismo é uma escola prática, uma experiência transformadora”, sublinha Maria Coutinho, na medida em que se aprende “a lidar com pessoas, planear eventos, comunicar com instituições e representar colegas”, para além de desenvolver “maturidade e consciência social”.
“Aprender o valor da democracia” é um dos fatores que Luana Ungureanu sublinha como relevante, contribuindo para que os alunos hoje envolvidos se tornem “cidadãos mais ativos e conscientes”, motores de responsabilidade coletiva e de intervenção cívica. É neste sentido que Rodrigo Monteiro acredita que há um estimulo ao pensamento crítico e ao sentido de responsabilidade social, além do envolvimento cívico. Sobre a construção de cidadania, Lara Miguel sublinha a importância de aprender a ouvir os outros, “mesmo quando não concordamos”.
“Se eu consigo, tu também consegues“
Por falta de vontade ou de tempo, há muitos estudantes que não se envolvem, mas estes dirigentes não deixam de tentar convencer os mais céticos. Dizer que é uma forma de aprender e fazer a diferença na escola é a ideia de Lara, que acrescenta: “Mesmo que pareça pouco, é com a nossa participação que as coisas mudam”. Rodrigo expõe os benefícios práticos: experiência, contactos e crescimento pessoal. João acredita que é necessário apresentar exemplos reais de ações da associação e de como podem contribuir na vida dos estudantes, “para não pensarem que estamos cá por um estatuto”.
E se Carolina sente que é aos jovens que compete “assegurar que o associativismo jovem não morre”, Margarida aconselha a experimentarem, “nem que seja uma vez”, para “perceber como é estar do outro lado e ver o impacto na escola” e deixa o repto: “Se eu consigo, tu também consegues”.

A olhar o futuro
Num futuro próximo, Lara Miguel acredita que o associativismo irá crescer, com jovens cada vez mais conscientes. João Baldaia crê que haverá uma transição digital e que os jovens vão lutar mais por causas ambientais e pela igualdade de género. “Associativismo mais tecnológico” e um maior espírito de intervenção e representação estudantil são as previsões de Luana Ungureanu. Maria Coutinho imagina mais conexão a causas sociais e sustentáveis, além da diversidade e dos meios digitais.
Estes estudantes olham para os anos que se avizinham com esperança, desejando que o papel do associativismo jovem possa ser valorizado pelos órgãos de poder político e pela comunidade civil e se torne preponderante no país, tendo em vista a inclusão das suas vozes nos debates sociais e nas decisões
políticas.
Texto: Daniela Rodrigues | Raquel Filipe | Samuel Ribas | Joaquim Faustino
Fotos: Kelly Sikkema | Unsplash ; gentilmente cedidas pelos entrevistados