Num período em que o mundo abrandou o ritmo em prol dos cuidados de saúde e em que o confinamento passou a ser obrigatório em muitos países, mudar as rotinas tornou-se essencial. Pais e educadores deparam-se com um desafio novo que antes era mais fácil de gerir: como conciliar a vida profissional e ajudar os filhos na vida escolar durante a quarentena?
Em teoria, pode parecer simples estruturar toda a agenda de teletrabalho e auxiliar os mais novos. Porém, é um desafio tanto para aqueles que continuam a ter de se deslocar para o local de trabalho e deixar os filhos em casa, como para os que se adaptaram a uma nova forma de atividade laboral. O medo e o stress passaram a caminhar lado a lado, aliados à insegurança e à incerteza. Helena Camelo, psicóloga clínica, afirma que um dos maiores desafios é “tranquilizar os filhos e passar uma mensagem positiva, ter a capacidade de gerir o distanciamento físico entre avós e netos”. Os progenitores, alerta, acabam, agora, “por se tornar profissionais, professores e pais, além de realizarem todas as tarefas de casa e, por isso, sentem que estão a falhar em todas as áreas”.
Magda Rodrigues, educadora de infância e mãe de Anaís, de 3 anos, confessa que as rotinas diárias foram quase todas alteradas, para os pais e para as crianças. “Nas primeiras duas semanas foi muito difícil. Quando estou a trabalhar, não consigo ter tempo de qualidade com a minha filha, nem o pai. Tentamos revezar-nos na atenção que lhe damos”, acrescenta. A creche de Anaís fechou e a instituição tentou manter contacto com as crianças através das plataformas digitais. No entanto, Magda revela que a resposta da entidade “ficou um pouco aquém das expetativas, sobretudo nas atividades sugeridas”.
Apesar das dificuldades iniciais, a gestão familiar dentro de casa começou a tornar-se mais fácil após as primeiras semanas de isolamento. Helena Camelo recomenda que “os pais tentem efetuar uma autogestão entre o casal, através de muita comunicação e compreensão dos limites de cada um. Ao estarem em constante comunicação, partilhando sentimentos, conseguem minimizar situações de stress para a criança e para eles mesmos”.
Nas primeiras semanas de confinamento, Magda confessa que se sentia “esgotada”, tendo conseguido, depois, minimizar os efeitos da nova rotina. No início, as “birras” de Anaís eram frequentes, mas após o primeiro mês estabilizaram, como se “tivesse adquirido um novo padrão de comportamentos familiares”, relata a mãe. A dança revelou-se uma boa estratégia para acalmar a pequena Anaís, aliada a momentos de meditação e outras pequenas atividades que ajudam a entreter as crianças.
Partos sem apoio familiar
Além das preocupações em manter os filhos ocupados e motivados para as aulas, aumentam também as angústias das recém-mamãs ou das que irão entrar em trabalho de parto durante a epidemia. Nos hospitais, as novas regras afastaram o acompanhamento presencial. A segurança da mãe e do bebé está em primeiro lugar, ainda que esse apoio presencial seja fundamental para a estabilidade emocional da gestante. Marta Amado é mãe de Constança de 4 anos e, agora, da bebé Leonor, nascida no passado mês de abril. “O meu maior receio era que tanto eu como a bebé pudéssemos ficar infetadas com a Covid-19, o que levaria ao afastamento das minhas duas filhas”, revela.
A falta de apoio da família foi bastante sentida por Marta. Outras adaptações foram necessárias para o procedimento do parto, como a utilização obrigatória de máscara, a diminuição do tempo de internamento, que “foi reduzido de 72h para 48h” e “o encerramento temporário de
alguns serviços, como, por exemplo, o registo de nascimento e a prestação de cuidados de saúde,” afirma. Tal como Magda Rodrigues, também Marta se sente esgotada e declara que anda um “pouco mais frágil, ansiosa e angustiada com as incertezas do futuro”.
A psicóloga Helena Camelo, também especializada em formação de pais, garante que “não é errado [os pais] admitirem que estão exaustos ou cansados” e é “fundamental fortalecer os laços afetivos, de amor, carinho e muita compreensão”. Em Portugal, o momento é de desconfinamento, mas com receio do que o futuro reserva. Helena Camelo não tem dúvidas em afirmar que esta experiência irá “refletir-se nas personalidades dos nossos filhos”, ressalvando, ainda, os pontos positivos: “Os pais conseguiram parar o botão de piloto automático, puderam conhecer melhor os seus filhos. Aprenderam a escutá-los e a ler nas entrelinhas”.
Texto: Eunice Rodrigues | Inês Mendes | Yasmine Nicole
Foto: Sandy Millar | Unsplash