9h30. Pego no telemóvel, ligo a internet e percorro as redes sociais. Ontem foi sábado, dia de sair. Foram a festas, discotecas, concertos, bares. Foram dançar, cantar, beber, divertir-se. Ah! E registar tudo. Claro!
Também estive num jantar. Não tirei fotografias, nem fiz vídeos. Não tenho registo das pessoas, da comida, das bebidas. Não tenho nem uma selfie. Convivi, diverti-me, vivi, mas não tirei fotos. Não existi. Por acaso, reparei num ou outro flash aqui e ali. Se houve mais cliques de fotografias, passou-me ao lado. Eu não tirei nenhuma e não acredito que tenha sido apanhada em nenhuma. Se alguém que esteve naquele jantar partilhar uma foto de ontem, eu não vou lá estar.
Na realidade, ontem diverti-me, mas não há nenhuma foto minha. Isso é normal na minha vida. Por mais tempo que passe em redes sociais, evito documentar a minha vida privada na esfera pública. Quer isto dizer que, para o mundo, ontem não existi. E em tantos outros dias acontece o mesmo. Parece que, atualmente, algo só acontece se for fotografado. Pode nem se gostar de onde se está, mas importa mostrar-se sempre na moda. #Party. #Friends. #BestNightEver. A última e ‘melhor noite’ desde a última vez que se usou a hashtag (na semana passada) e só até à próxima vez que se voltar a usar (na semana seguinte).
A internet é um mundo e o que não é partilhado parece não ser real. O privado é cada vez menos privado. Vive-se para os gostos, partilhas e cometários. Vive-se para o instantâneo.
Talvez não para o mundo, mas ontem existi. Porque, para mim, existir é desfrutar, apreciar o momento, sentir, e guardar na memória. Partilhar com quem está presente e não com tantos outros que, tal como eu, para matar tempo, ligam as redes sociais, fazem scroll pelos feeds, veem tudo e não reparam em nada.
Texto: Marisa Vitoriano