A união faz a música

A música é sinónimo de união em Chãs, na freguesia de Regueira de Pontes, em Leiria. A filarmónica da localidade estende o palco a instrumentos e a músicos de diversas idades. Às sextas-feiras, os ensaios revelam-se essenciais para o bem-estar dos jovens músicos.

No edifício da escola de música da Filarmónica de Chãs, às 21h30, dá-se início a mais um ensaio da banda, onde os instrumentos, divididos por naipes, se fazem ouvir em uníssono. Criada em 1896, a associação surgiu de um grupo de amigos e essa identidade perdura até aos dias de hoje. Na altura dos primeiros estatutos, em 1931, contava com 39 músicos. Hoje são mais de uma centena.

“O nosso lema é a união, é sermos coesos, é sermos nós próprios e sermos persistentes”, refere com satisfação a presidente da escola de música, Hermínia Monteiro. 

À medida que novos membros se vão juntando, a banda recebe-os como uma família, um termo que se aproxima da realidade com as comemorações anuais que passam por um “batismo musical”. Tal como no sacramento cristão, a água é vertida sobre a cabeça dos novatos, ritual que é acompanhado de um apadrinhamento por parte de outros membros da banda e finalizado com um “bem-vindos à família”, vindo do maestro.

Esse rito não remete somente para uma espécie de iniciação à música. Trata-se, também, de uma nova etapa que procura cruzar o desenvolvimento pessoal com a formação musical e o contacto com um espaço rico em etnografia e cultura. Um dos objetivos da Filarmónica de Chãs, realça o maestro Rolando Ferreira, é “educar como músicos, mas igualmente como homens e mulheres do amanhã”.

Rodrigo Vieira é um dos membros da banda e, aos 19 anos, já passou oito acompanhado da trompa. A escolha do instrumento surgiu após participar numa aula aberta, influenciado pelo seu primo, outro membro da coletividade. A música apareceu na vida de Rodrigo por volta dos seis anos e mantém-se até aos dias de hoje como um escape à vida real: “A música distrai-me dos restantes assuntos da minha vida e relaxa-me’’.

O músico considera que as melodias de estilo clássico ainda são alvo de algum preconceito por parte dos jovens. Embora exprima preferência pelos géneros eletrónico e pop, escolheu a música clássica pela sua história, acabando por se identificar. Os consumos musicais de Rodrigo passam, ainda, pela rádio, que lhe faz companhia nas viagens de carro: “Na rádio, eu ouço o que estiver a passar”.

Mariana Silva, de 22 anos, também aderiu ao ritual de iniciação musical em Chãs, onde ingressou em 2008, tornando-se professora de saxofone em 2019. A música surgiu enquanto frequentava a escola primária, numa atividade extracurricular, lecionada por uma professora que a incentivou a integrar a filarmónica. Hoje faz de tal forma parte do seu quotidiano que decidiu seguir uma licenciatura em Música.

A instrumentista partilha a ideia de que as bandas filarmónicas são pouco consideradas pelos mais novos e refere o desconhecimento como o principal motivo. “Os jovens não conhecem o que se passa dentro das filarmónicas, não escutam, não sabem o que tocamos. A realidade é que não tocamos só música clássica, tocamos, por exemplo, rock e pop”, afirma Mariana, ao mesmo tempo que aponta outra razão para esse afastamento: “Os jovens já não têm escolhido tanto a música como um hobby, optando maioritariamente por atividades desportivas”.

A música clássica é a preferida de Mariana e a rádio Antena 2 é a escolhida para lhe fazer companhia durante as viagens de carro. Fora do estilo clássico, gosta de música pop e outras sonoridades que ouve através da Antena 3, outra emissora de eleição.

As atividades extracurriculares também foram a porta de entrada da escola de música de Chãs para Bruna Gomes, na altura a frequentar o 4.º ano. A música parece ser mesmo o maestro dos estados de alma mais contrários: “Recorro muito à música quando estou triste, mas igualmente quando estou nos meus dias mais alegres”.

Segundo a instrumentista de 22 anos, os jovens têm uma perceção errada sobre os géneros musicais que as filarmónicas tocam, além de não perceberem – porque não conhecem – o quão ricos estes espaços são do ponto de vista sociocultural. “Acham que a música das filarmónicas se destina ao público mais idoso”, esclarece. Apesar do gosto pela música e da preferência por estações de rádio como a RFM, Cidade FM e M80, Bruna gostar de ouvir rádio também para se manter a par das notícias.

A Filarmónica de Chãs é vista como uma família por todos os que nela participam. É reconhecida, sobretudo, como um espaço relevante para a criação e conservação da identidade local, pois amplia, tal como outras filarmónicas, a coesão social e possibilita aos mais novos a entrada no meio artístico.

Texto: Maria Rosa | Marisa Carreira | Valentina Guedes