Foto | Liliana Pereira
Dirigida por Lucilina Sobreiro, a Escola de Dança de Torres Vedras (EDTV) existe há quarenta anos. É uma pequena porta que separa da rua toda a magia que está naquele grande salão. O ranger das escadas guardam os sentimentos dos alunos que passaram e passam por lá todos os dias e nas paredes ficam as memórias das coreografias e dos espetáculos. Por detrás de um grande pano vermelho, tudo acontece. É lá que se juntam e criam uma grande família que se une com laços inquebráveis. No centro do salão há um candeeiro enorme, reluzente, o maior cúmplice da transformação que a dança faz nos alunos que por lá crescem.
Os primeiros passos de dança
Disciplina, exigência e rigor são as palavras que melhor caracterizam a dança para Lucilina Sobreiro. A diretora da EDTV conta que “era muito exigente” porque a vida deu-lhe “a possibilidade de, muito nova, enfrentar dificuldades” e, portanto, sente “que é na disciplina, no rigor e no amor” que se encontra “o que precisamos para nos desenvolvermos”. A diretora conta que, desde criança, se lembra de estar em frente ao espelho a dançar. Foi a dança que lhe “encheu a alma” nos momentos mais escuros. Lucilina vai mais longe e conta a história de como ocorreu a ideia da criação da escola. Casou muito nova e ficou viúva com apenas 20 anos. Durante muito tempo, ia para Santa Cruz olhar o horizonte, a ouvir música e imaginava, muitas vezes, aquela música dançada. Foram estes momentos que fizeram com que ganhasse força para continuar. E, após ter ganho um concurso televisivo, fez com que muitas pessoas quisessem aprender com ela e assim decidiu criar a Escola de Dança de Torres Vedras. Ainda hoje, com 75 anos, Lucilina continua a trabalhar na sua escola, com a mesma garra que sempre teve. “O mais engraçado é que ainda estou a ter aulas de dança de Tango Argentino, em Lisboa e na Argentina, porque não quero parar”, explica a professora de dança.
Liliana Pereira, ex-aluna da EDTV, conta que andou “na dança desde muito nova, desde os 4 anos”. “Não me conheço para além da dança”, refere. Era ela um dos “passarinhos” de Lucilina (o nome que dava aos seus alunos), no tempo em que dava aulas de dança e que passava horas a contar-lhes histórias sobre a sua vida. Para a ex-aluna “a dança tem de fazer parte [da vida], é importante para o desenvolvimento das pessoas e autoconhecimento, mas também para conseguirem libertar algumas coisas que não conseguem expressar”. “Até serve para comunicar [contigo mesmo] quando não o queres fazer com mais ninguém”, acrescenta. Considera que o facto de ter entrado cedo no mundo da dança fez com que percebesse mais depressa o que ela e os outros sentem, a ser mais empática, mais feliz, menos angustiada e menos ansiosa.
Foto | Francisco Malhado
Francisco Malhado, neto de Lucilina e, ao momento, professor na escola, afirma que cresceu no palco e que não sabe o que é que é a sua vida antes da dança. Sente que a sua entrada neste mundo “foi muito natural”, tendo acontecido por volta dos dos ou três anos de idade. O professor de 27 anos vai mais além e refere que a dança dá aos alunos “ferramentas, características e trunfos para o dia a dia, e apesar de na altura não se aperceberem, quando crescerem reparam. O à vontade com o público, o saber comunicar e estar, são valores que transbordam na pista de dança”. Francisco foi parceiro de dança de Liliana e agora, para além de professor na EDTV, também dá aulas em várias escolas. Tal como a sua avó, considera a disciplina um fator determinante e, quando ao chegar às escolas o avisam de que os alunos não têm muito respeito, aceita o desafio. Na segunda sessão, já estão “todos em sentido, de barriga para dentro, costas direitas, a fazer uma vénia e a dizer «Bom dia, professor Francisco»”. E quando os outros professores lhe pergunta como o fez, ele simplesmente responde que é o “colégio militar com diversão”.
Liliana ainda utiliza, no quotidiano, as ferramentas que aprendeu com a dança, agora como estudante do mestrado em Mediação Intercultural e Intervenção Social. A ex-aluna da escola escolhe a disciplina e a exigência como alguns dos exemplos, pois são as ferramentas que consideram torná-la uma pessoa melhor. Já desde pequena as tinha, pois, em termos de coreografias, revela que “queria ser perfeita em todos os passos de dança”.