Comércio local: Por calçadas históricas e espaços singulares

No sobe e desce das vendas, a pandemia não é igual para todos

A diminuição da faturação em tempos de pandemia e a proximidade com os clientes são, de facto, aspetos que igualmente caracterizam outro espaço comercial do centro histórico de Leiria, a Pastelaria LuziClara.

“O negócio está longe de voltar ao que era antes da pandemia. Apesar de estarmos abertos todos os dias, de domingo a domingo, as pessoas vêm menos e também levam menos. Em vez de comprarem bolos às dezenas, como acontecia, levam apenas o mínimo”, refere Vasco Silva, um dos responsáveis pelo negócio e cuja motivação para abraçar este desafio reside no carinho que nutre pela tradição familiar.

O cheiro que vem de dentro denuncia a confeção de bolos acabadinhos de fazer. Vasco Silva, de 34 anos, estudou arquitetura e até já pensou em abandonar a gestão da pastelaria, mas a paixão pela história de vida da sua tia-avó Luzia tem-no feito ficar com os irmãos e os pais. “Com o tempo, vou ficando a saber mais sobre a forma de vida altruísta que a minha tia levava e estar aqui a ajudar a minha família e a perpetuar esta história é muito importante para mim”, começa por contar.

“Ela veio morar para este edifício para tomar conta de uma filha de uma família da alta burguesia, que tinha uma deficiência motora”, recorda Vasco. Assumindo os cuidados da pequena como a sua missão de vida, a tia-avó Luzia parece ter-se tornado numa verdadeiramente empreendedora, ainda que os recursos fossem escassos.

“Começou a recolher receitas nas redondezas e a vender o que confecionava localmente, sobretudo junto de famílias de uma classe social mais alta, como em São Pedro de Moel. Toda a gente queria ser a primeira a receber a minha tia, para poder escolher os bolos”, afirma orgulhoso o sobrinho-neto.

Com 12 anos, a mãe de Vasco veio ajudar a tia Luzia na confeção dos bolos. A pastelaria foi oficialmente fundada em 1991. Antes, porém, a tia Luzia já contava com cerca de 40 anos de serviço caseiro, onde o passa-a-palavra era o segredo do sucesso. Desde 2012 que a mãe de Vasco e a irmã se empenham na confeção dos produtos, enquanto o pai e ele próprio se ocupam do atendimento. Tal como nos tempos do serviço caseiro da tia Luzia, o atendimento e a relação com os clientes parecem ser hoje a alma do negócio. E nem a distância social que a pandemia impôs perturbou
essa relação. “Nos meses de confinamento em que as pessoas não podiam sair das próprias casas, fomos levar onde podíamos, já que temos clientes de longa data e uma relação muito próxima, que queremos preservar”, sublinha Vasco Silva.

Um cenário totalmente distinto é o da casa CIL – Carlos Infante Lacerda, a loja de eletrodomésticos mais antiga de Leiria, cuja data de origem remonta ao primeiro vinténio do século XX.

“Apesar de estarmos a atravessar uma fase complicada, atrevo-me a dizer que devo ter vendido mais este ano do que no ano passado. Sobretudo, nos meses de confinamento, as pessoas com receio de ir para o shopping, ligavam-me a perguntar se tinha determinado equipamento. Além disso, como passaram mais tempo em casa, aproveitaram para fazer pequenos biscates”, afirma Rui Pombeiro, de 43 anos, o atual responsável pelo espaço.

Carlos Lacerda foi o principal sócio do estabelecimento, tendo aberto a sociedade a mais dois colegas. “Um deles chamava-se Rodrigo Faustino, patrão do meu pai. O outro foi o meu próprio pai, que mais tarde viria a ser o único responsável, tendo tido oito eletricistas ao seu encargo”, conta o proprietário, filho de Francisco Pombeiro.

No número nove da rua D. Dinis, a montra é composta por um conjunto de pequenos eletrodomésticos. Mas nem sempre foi assim. Outrora, a loja vendeu outro tipo de produtos para além do seu negócio central, o material elétrico e as instalações em obras. Isso aconteceu na sequência de uma intervenção para requalificação do edifício: “Fizemos obras e encontrámos tabuadas, réguas, material elétrico e outros materiais de escritório”.

Hoje, o mesmo espaço originou a casa CIL – Comércio e Instalações, LDA, que, apesar da concorrência das grandes superfícies e das empresas de construção civil, consegue manter o seu negócio devido ao serviço externo de instalações, por exemplo em escolas, empresas ou em trabalhos solicitados pela Câmara.

Mas as restrições que a crise sanitária impõe e o seu impacto na economia não são ignoradas por Rui Pombeiro. Pelo contrário, o responsável pela casa CIL gosta de animação nas ruas e de movimento: “Não gosto que uma loja feche na rua. Pode parecer que não me afeta, mas a verdade é que isso faz com que menos pessoas passem por aqui. Por isso, é importante dinamizar as ruas com atividades”.